Após 23h, menores desacompanhados
estão proibidos de ficarem na rua
Diz o ditado que o direito de ir e vir não é o direito de ficar à deriva... É o que parece começar a acontecer na Comarca de Muriaé com a implantação do “Toque de Recolher”, que passa a vigorar a partir desta sexta-feira (28). A medida, adotada em muitas regiões do Brasil, determina que, após certo horário, os menores de 18 anos devem retornar a seus lares, caso estejam desacompanhados na rua. No caso de nosso município – e também de Rosário da Limeira e Laranjal -, o horário determinado foi 23 horas.
De acordo com o Juiz da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Muriaé, Dr. Sérgio Murilo Pasceli, a decisão é fruto do alto índice crimes envolvendo menores de idade. “Temos como objetivo um trabalho preventivo e de conscientização de toda a sociedade. Trata-se de uma medida discriminatória, respaldada pela sociedade, que vive com medo da doença chamada violência. A sociedade apóia o toque porque, no Brasil, de um modo geral, se vive entre a omissão e a histeria”, destacou Dr. Sérgio Pasceli.
O “Toque de Recolher” será aplicado por agentes envolvidos com as crianças, adolescentes e jovens da cidade, tais como conselheiros tutelares, assistentes sociais, comissários, policiais militares e civis, com apoios da Polícia Rodoviária Federal e do Corpo de Bombeiros, dentre outras instituições.
Em Muriaé, segundo o Juiz Pasceli, o cumprimento da medida terá respaldo, ainda, em duas equipes formadas por representantes da OAB, no Conselho Tutelar, no Comissário de Menor, em psicólogos, assistente social, e nas Polícias Militar e Civil, no intuito de resolver qualquer eventualidade já no local da fiscalização.
A fiscalização, que será feita entre as quintas-feiras e os sábados, chegará a bares da cidade e região. Os menores encontrados em situação de risco serão levados a seus lares em um microônibus, acompanhado de viaturas. Ocorrendo uma terceira incidência no erro, haverá punição de acordo com a legislação do Estatuto da Criança e Adolescente.
Os trâmites finais para o “Toque de Recolher” foram acertados na última quarta-feira (26), durante uma reunião realizada no salão do Júri do Fórum, com participação de representantes de entidades sociais e civis, instituições públicas e da justiça local, assim como de alguns componentes das equipes que irão atuar no cumprimento deste trabalho. Para este sábado (29), está prevista uma panfletagem no centro de Muriaé.
De acordo com o conselheiro tutelar e secretário (voluntário) do Comissariado da Criança e Juventude de Muriaé, Wilson de Freitas Soares, a iniciativa é uma forma de defender os adolescentes da violência que tem cercado, em especial, as noites nas cidades: “Em Muriaé esta medida será de extrema importância, pois iremos prevenir e proteger os menores de 18 anos, quando em risco pelas ruas, em contato com o álcool, drogas e prostituição”, ressaltou.
Contudo, a opinião do conselheiro não é unânime. Muitas pessoas são contra a adoção da medida, entre elas o coordenador do Comitê pró-conselho da Juventude de Muriaé e assessor Diocesano da Pastoral da Juventude, Vinícius Mendes Ventura. Em carta destinada à mídia, ele, que também é acadêmico de Serviço Social, defendeu um estudo mais aprofundado do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como a criação de um Conselho Municipal da Juventude e Políticas Pública: “Conforme estudos e, após quase 12 anos de militância a favor da juventude, não acredito que esse ato de não-liberdade (toque de recolher) seja a solução. É como se estivessem culpando, nós, jovens, pelo alto índice de violência. Tal ação apenas nos caracteriza como uma sociedade cada vez mais positivista, onde pretende-se manter a ordem (e o progresso)”, pontuou.
Para Vinícius, é também fundamental uma integração de setores para que a verdadeira proteção à infância e à adolescência surta valor significativo: “Não podemos resumir nosso discurso em defender as crianças, os adolescente e os jovens contra a criminalização dessa forma. Precisamos sim, nós, como sociedade civil, em parceria com o poder público, assumir a defesa de políticas públicas contra as medidas paliativas e ilusórias que escondem o problema ao invés de resolvê-lo”, completou.
O principal, como bem destacado nas palavras acima, é a garantia não apenas do direito de ir e vir do adolescente, mas de sua estabilidade, de forma que ele não fique à deriva frente às ondas de violência do muno atual. Garantir um rumo e um destino para os jovens envolve um grande aprendizado: do próprio jovem, da família, da Justiça e da sociedade. Muriaé já está com lápis e papel na mão, aguardando as primeiras notas desta lição. Resta a todos contribuir.